O mercado de Coaching cresceu de forma vertiginosa em todo o mundo, e no nosso país não foi diferente. Como em outras profissões não-regulamentadas, posturas sensacionalistas, tecnicamente inconsistentes e eticamente questionáveis são bastante comuns.

UM MERCADO “COMPLICADO”

A entrada nesse mercado é facilitada tendo em vista que na maior parte das instituições de formação não existem pré-requisitos ou avaliação prévia; basta pagar o valor do investimento proposto e, após concluir o curso, a pessoa já está apta a trabalhar na área. Aliás, como uma profissão não-regulamentada, qualquer um que se intitular coach (com ou sem a devida formação) pode trabalhar como tal.

Estamos, portanto, diante de uma questão delicada.

Num processo de Coaching é muito provável que aspectos emocionais, cognitivos e comportamentais importantes sejam recrutados ao longo das sessões e do processo como um todo. Afinal, independente do objetivo do cliente, está em jogo algo muito importante para a vida dele. Numa trajetória dessas, rumo ao seu objetivo, o cliente acaba saindo de sua zona de conforto, desenvolvendo certas habilidades, enfrentando situações difíceis, sendo chamado a se comportar diferente do que estava acostumado.

Inevitavelmente isto tem um impacto subjetivo em cada cliente. E, inúmeras vezes, é o manejo deste impacto que, quando feito de forma adequada, contribui significativamente para o sucesso do processo. Neste aspecto, em especial, os papéis desempenhados por um coach acabam sendo bastante similares ao de um psicólogo.

Fica, então, o questionamento: “Até que ponto um coach que não é psicólogo está preparado para lidar com esse manejo de forma adequada?” Afinal, em 4, 6 ou 8 dias de curso de formação uma pessoa consegue aprender e treinar com profundidade esse manejo que nós, psicólogos, estudamos e praticamos por no mínimo 5 anos?

Um advogado que também é coach, um cabeleireiro que também é coach, um engenheiro que também é coach, uma pessoa que estudou até o Ensino Fundamental que também é coach, etc., estão preparados para lidar com aspectos subjetivos suscitados durante um processo de Coaching? Não necessariamente. Um psicólogo que também é coach, estaria? Não necessariamente! Não sejamos ingênuos. Profissionais medíocres existem em qualquer área, e a Psicologia não está isenta disso. Mas não podemos ignorar que a nossa graduação nos coloca numa situação vantajosa.

O ESPAÇO DA PSICOLOGIA

Diante do despreparo que observamos nesse contexto, o maior incômodo reside em ver colegas coaches que não são psicólogos atendendo demandas que jamais seriam demandas para um processo de Coaching, e sim para psicoterapia, por exemplo. Não são poucos os relatos de pessoas que, ao procurarem a ajuda de coaches que não são psicólogos, acabaram sendo conduzidas a um processo de Coaching por falta de preparo técnico e ético do coach para discernir qual o encaminhamento mais adequado para o caso. O incômodo perpassa pelo fato de coaches estarem adentrando em atuações da Psicologia e tocando num ponto ainda mais delicado: pessoas sendo submetidas a intervenções inapropriadas que, além de não funcionarem, podem agravar seu quadro de sofrimento.

Não queremos defender a ideia de que a Psicologia detém todas as respostas, tampouco afirmar que coaches sem formação em Psicologia não possam ser excelentes profissionais. Pelo contrário, muitos empreendem um trabalho sério, embasado e ético, associando o Coaching à sua bagagem teórica e prática advinda de diversos campos. O que queremos chamar atenção com essas reflexões é que muitos processos de Coaching mobilizam questões subjetivas que podem ser melhor acolhidas por coaches que sejam também psicólogos, ou seja, por psicólogos-coaches¹.

Sem sombra de dúvidas, somado ao fato de um psicólogo-coach estudar as bases científicas, a metodologia e as ferramentas do Coaching, os 5 anos de estudo e prática na graduação em Psicologia (além de cursos após a graduação) coloca tais profissionais numa posição privilegiada para conduzir processos de desenvolvimento humano.

O que fazer diante desse quadro?

O que foi exposto até agora poderia, para algumas pessoas, fazer pensar que a associação entre a Psicologia e o Coaching pode ser ruim para nós, psicólogos. Essa perspectiva, inclusive, foi uma das principais justificativas no contexto brasileiro para posicionamentos anteriores do Conselho Federal de Psicologia (CFP) e dos Conselhos Regionais de Psicologia (CRPs) recomendando a não associação entre essas duas áreas na tentativa de proteger e preservar a nossa profissão. Vale lembrar, entretanto, que desde 19 de Março de 2019 o CFP lançou uma nota orientativa dizendo que não há problema algum que psicólogos(as) façam uso dessa metodologia em suas práticas, desde que respeitando o Código de Ética Profissional do Psicólogo.

DE MÃOS DADAS

Nesse sentido, queremos contribuir com essa discussão com o seguinte viés: a Psicologia e o Coaching devem andar de mãos dadas. Afinal, ninguém melhor que um coach que também é psicólogo para acolher e identificar de forma crítica e ética a natureza da demanda que uma pessoa apresenta e, a partir de então, propor a melhor metodologia de trabalho para aquele contexto (psicoterapia, coaching, orientação profissional, avaliação psicológica, supervisão, consultoria, etc.). Sabemos que a Psicologia por si só é capaz de desenvolver indivíduos e conduzi-los aos seus objetivos, mas é inegável que nesse campo o Coaching nos traz contribuições ao apresentar-se como uma metodologia focada, atualizada, estratégica e com olhares de outras ciências.

Corroborando essa perspectiva, vale compartilhar o posicionamento do Parecer Sobre Coaching da Ordem dos Psicólogos Portugueses – OPP (em Portugal este é o órgão equivalente ao Conselho Federal de Psicologia) ao recomendar, desde 2014, que sempre que processos de Coaching demandarem desenvolvimento cognitivo e emocionais significativos, o coach deve ter formação em Psicologia. Para a OPP, o Coaching é um ato psicológico e, portanto, deve ser desempenhado por psicólogos(as).

Nesse sentido, o cenário internacional se mobiliza quanto ao diálogo entre a Psicologia e o Coaching desde o final da década de 90 e o início dos anos 2000, período no qual iniciaram-se movimentos organizados por parte de psicólogos a fim de pesquisar e propor, em algum sentido, o uso do conhecimento que a Psicologia vem produzindo ao longo dos anos para dar credibilidade e embasamento à prática de Coaching – por entender o Coaching traz perspectivas e atualizações relevantes para a Psicologia.

De acordo com Grant e Cavanagh (2007), a partir de 1996, por conta de uma publicação especial sobre Coaching Executivo no periódico da APA (Associação Psicológica Americana) intitulado “Consulting Psychology: Theory, Research and Practice”, veio à tona o papel do psicólogo como um coach executivo.

Foi depois dessa publicação que uma discussão mais formal e organizada sobre o papel dos psicólogos no Coaching tornou-se frequente. Um marco ocorreu em 2000, quando foi fundado o Departamento de Coaching Psychology na Universidade de Sydney, oferecendo a primeira pós-graduação no mundo em Coaching Psicológico. Desde então, cresceu enormemente o número de grupos de interesse, discussão e produção científica sobre Coaching Psicológico em países como Inglaterra, Suíça, África do Sul, Dinamarca, Espanha, Irlanda, Hungria, Nova Zelândia, Suécia, Israel, Holanda, Japão, Itália, Coréia do Sul, EUA, Singapura e Sérvia (PALMER e WHYBROW, 2018).

Observou-se, também, um aumento no número de universidades renomadas mundo afora (especialmente nos EUA, Canadá, Inglaterra, Portugal e Austrália) oferecendo disciplinas isoladas e programas de Pós-Graduação em Coaching Psicológico.

UMA PERSPECTIVA NÃO TÃO NOVA

Então, o que é o Coaching Psicológico²?

De acordo com Grant (2006, p. 16), trata-se da “aplicação sistemática da ciência comportamental para o aprimoramento da experiência de vida, desempenho no trabalho e bem-estar de indivíduos, grupos e organizações que não possuem problemas mentais clinicamente significativos ou níveis anormais de angústia”.

Palmer e Whybrow (2005, p. 8) acrescentam que o Coaching Psicológico é uma prática voltada para psicólogos e que tem suas raízes na Psicologia como forma de integrar os seus conhecimentos sobre o ser humano a fim de desenvolver formas de intervenção que promovam o bem-estar e o desempenho tanto individual quanto de grupos e organizações. Para os autores trata-se da “[…] aplicação de princípios e teorias psicológicas para apoiar a prática de Coaching”.

Portanto, o diálogo é possível!

Muitos psicólogos têm argumentado que não é necessário se tornar um coach para que possamos desempenhar nosso trabalho e para que consigamos ajudar as pessoas em seu desenvolvimento e crescimento pessoal e profissional. Até porque, de fato, observa-se algumas vezes que como psicólogos eventualmente nós já nos comportamos e adotamos práticas típicas de um coach.

Não discordamos dessa ideia, apesar de a considerarmos problemática. O problema não é o que ela comunica, mas sim o raciocínio do qual é fruto. Muitas vezes é proferida por psicólogos que desconhecem a metodologia e a aplicabilidade do Coaching, ou as conhecem apenas através de noções banalizadas e mercadológicas desonestas. Assim, essa lógica surge para supostamente proteger a Psicologia e atacar o Coaching.

Acreditamos que compreender a amplitude da nossa atuação não deve ser motivo para invalidar o fato de ser possível a Psicologia encontrar contribuições e novas perspectivas ao dialogar com o Coaching.

No lugar de nos dissociarmos desta prática, pensamos ser de extrema relevância que nos apropriemos dela, fazendo uso de todo conhecimento teórico e prático que a Psicologia nos proporciona.

Esta parece ser uma excelente oportunidade de fortalecermos a Psicologia no cenário nacional, visto que o Coaching conseguiu ocupar um lugar na representação social que a Psicologia não foi tão efetiva: o de prática apta a potencializar o que existe de melhor nas pessoas.

Ressaltamos a importância do incentivo à busca pelo estudo e capacitação dos psicólogos-coaches a fim de, num futuro breve, pessoas que queiram passar por um processo de Coaching naturalmente passem a desejar, cada vez mais, um psicólogo-coach por acreditarem e constatarem que estarão melhor amparadas e assistidas desta forma.

Já que o Coaching se utiliza de uma infinidade de conhecimentos científicos produzidos por diversas ciências, especialmente pela Psicologia, faz-se necessário entender com maior profundidade a realidade e, então, assumirmos as rédeas da situação. Nesse sentido seria, sobretudo, ético a Psicologia se apropriar do Coaching.

Por pensarmos assim é que desde 2016 oferecemos, pela Academia do Psicólogo, uma Formação em Coaching Psicológico exclusiva para profissionais psis. Diante do cenário de insatisfação geral e desconhecimento, nossa Formação chegou inclusie a ser denunciada com antética ao CRP de São Paulo, que após analisar detalhadamente nosso site, não apenas não constatou nenhum problema como ainda emitiu uma nota informando que a prática do coaching pode sim, ser feita por psicólogos.

Caso queira ver esta nota na íntegra, basta clicar aqui.

E se você tem interesse em se aprofundar nos estudos nessa área, convidamos para acessar o site www.coachingpsychology.com.br para mais informações a respeito do tema, bem como conhecer com detalhes nosso Programa de Formação. Temos turmas durante todo o ano de 2021 e será um prazer ter você conosco.

REFERÊNCIAS

GRANT, Anthony M. A personal perspective on professional Coaching and the development of Coaching psychology. In: International Coaching Psychology Review. v. 1 n. 1, p. 12-22, Apr., 2006.

GRANT, Anthony M.; CAVANAGH, Michael. Coaching Psychology: how did we get here and whereare we going?. [S.L.: s. n.], 2007.

Ordem dos Psicólogos Portugueses. Parecer sobre Coaching. Lisboa, 2014.

PALMER, Stephen; WHYBROW, Alison. Handbook of Coaching Psychology: A Guide for Practitioners. 2nd Edition, New York: Routledge, 2018.

PALMER, Stephen; WHYBROW, Alison. The proposal to establish a Special Group in Coaching Psychology. In: The C

oaching Psychologist. n. 1, p. 5-12, July, 2005.

¹ Essa terminologia vem de “coaching psychologists”, expressão inglesa utilizada para denominar os psicólogos que se apropriam do Coaching e, portanto, passam a atuar como psicólogos-coaches.

² Em inglês a terminologia utilizada é Coaching Psychology.

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